quarta-feira, 10 de março de 2010

A Dieta da Vingança

Texto de Dudu Lopes

justica.jpg

TODO MUNDO SABE que vingança é um prato que se come frio. Alguns outros, como eu, que já se fartaram em literatura religiosa, sabem também que não se deve cultivar sentimentos de vingança, que isso traz problemas na vida, interfere na saúde e cria uma ligação com o sujeito para quem se dirige o sentimento da vingança.

O que poucos sabem é que vingança é um prato que se come, obrigatoriamente. Não é simplesmente cultivando o esquecimento de algo injusto que nos fizeram, ou ainda nos fazem, que tudo irá desaparecer por milagre.

Galinha Suicida

A vingança é uma galinha suicida que pula na nossa mesa, se aninha em nosso prato, na esperança de ser ingerida definitivamente. Essa galinha ensandecida não pode ser ignorada porque ela se aninha em nosso prato constantemente, sujando a comida limpa, infectando tudo o mais que ingerimos.

Perdoar é digerir a galinha maluca, preparada de maneira higiênica, no estômago da Justiça.

Ao contrário do que se pensa, esquecer não é perdoar. A memória é uma das coisas que mais se enraízam na mente, ela penetra nos recantos do esgoto no subconsciente, ou por trás dos véus na inconsciência, ou mesmo na sabedoria do superconsciente, mas não desaparece por si.

Agressão Não Se Esquece

Se, alguma vez, um amigo lhe deu um soco no rosto, por mais que você procure esquecer esse ato causado por um impulso momentâneo, ele vai estar registrado nos mecanismos de defesa de seu corpo. E sempre que seu amigo levantar a mão de repente, o seu corpo se lembrará do soco e reagirá de acordo, no mínimo, com um sobressalto.

Um soco é algo grosseiro, mas existem agressões muito sutis como aquele amigo que constantemente lhe rouba a cena num círculo social, ou aquela pessoa que não lhe responde um sorriso com um sorriso.

E existem aquelas agressões que são tão próximas que se tornaram parte de nossa vida, e por isso se tornam invisíveis, geralmente causadas por parentes muito próximos como pais e filhos.

Transferindo a Vingança

Essa galinha da vingança se interpõe em tudo o que fazemos e, o que é o mais grave de tudo, faz com que causemos em outras pessoas que nada tem a ver com o ato que sofremos, estranhos inocentes, o mesmo sofrimento injusto que sofremos. Fazemos isso em completa inconsciência, em maior ou menor grau ao sofrido, mas fazemos até nos livrarmos da galinha infecciosa da vingança.

Esquecer a agressão sofrida é o mesmo que transferir a dor da injustiça do que foi feito contra nós para outra pessoa. Por exemplo, uma pessoa agredida por alguém em posição superior (mãe, pai, chefe, etc) tende a passar essa agressão adiante para alguém em posição inferior (filho, subalterno), na grande maioria das vezes de forma completamente inconsciente de seu próprio ato.

Ser justo não é tão fácil quanto os livros religiosos nos fazem parecer. Um juiz que não tenha comido a sua galinha insana da vingança tende a transferi-la inadvertidamente nas suas decisões, uma mãe ou pai faz o mesmo.

Comendo a Galinha

Para comer essa galinha maluca ela deve ser abatida e limpa.

"Abater a galinha" é matar a vitalidade do sentimento de vingança. Pra isso, é importante dissecar a situação, descobrir porque você sofreu a agressão, particularmente o que você fez ou deixou de fazer, ou o que você tem ou que deixa de ter que levou alguém a ter a capacidade de atingir você.

Por exemplo, certa vez uma cliente me disse que, num desses workshops entre os funcionários de uma empresa, praticamente todos os seus colegas reclamaram de seu mau humor. Ela nunca havia se dado conta desse mau humor. Existem várias razões para o mau humor, por isso, perguntei algumas coisas e, por fim, chegamos ao fato de que seu ex-marido havia utilizado o mau humor para esconder uma relação fora do casamento. O mau humor do ex-marido funcionava como uma couraça que não a deixava nem mesmo intuir que o marido pudesse ter alguém fora do casamento.

Sem nenhum sinal, abruptamente, o então marido terminou a sua relação. Mais do que triste, ela ficou com um grande ódio por ter sido pega de surpresa e ter que modificar toda a sua vida por conta de uma separação.

Perdoando sem Perdoar

Por conta de uma formação religiosa ela procurou esquecer o que o marido fez, como se esquecer fosse o mesmo que perdoar.

Perdoar é equilibrar. Quem quer ser perdoado deve procurar equilibrar em igual intensidade o que fez de errado ao outro. De só pedir perdão, o inferno está cheio; somente palavras não demonstra nenhum arrependimento sincero. O correto é chamar mentalmente a Justiça e ficar atento para que uma oportunidade surja para você equilibrar a situação.

O contrário também é verdadeiro. Chame a Justiça até a sua vida e aguarde uma oportunidade para que a situação se equilibre quando alguém lhe fizer um mal. No caso de minha cliente, uma falha nos tramites legais da separação lhe trouxe uma ótima oportunidade de ganho, coisa que facilitou muito a parte material de sua separação.

Não é uma questão de olho por olho e dente por dente, nem de dar a outra face; a vida é muito maior do que apenas essas duas opções. É uma questão de deixar a Justiça, o equilíbrio natural da natureza oculta, não permitir que haja uma falta de balanço no mundo, em particular, na sua vida. Tanto a seu favor como contra você.

Invocando a Justiça

Para chamar a Justiça em determinado assunto é necessário dois itens básicos: conhecimento e energia.

Procure acumular conhecimento, procurando entender o que aconteceu. Não fique preso somente à emoção da situação e daí ficar reclamando para aliviar a dor dos sentimentos, faça isso outra hora. Para acumular conhecimento, é necessário entender o que falta em você que permitiu uma situação agressiva o atingir; não se preocupe em encontrar a solução para essa carência ou fraqueza, apenas a enxergue o mais claramente possível.

Depois disso, coloque energia na coisa, encontre o seu ódio ou tristeza ou qualquer outra emoção que tenha sido evidenciada pela agressão e peça mentalmente para que a Justiça utilize a energia desse sentimento para equilibrar a situação.

Não pense que a Justiça, aquela Potência que equilibra as coisas na vida de todos nós, é uma espécie de mamãe que vai bater na mão de seu coleguinha pra ele não lhe bater mais; a Justiça vai equilibrar a situação como Ela achar melhor, por isso, não peça nada específico, porque não funciona assim. No caso de minha cliente, a Justiça não encontrou necessidade de um equilíbrio emocional, somente material; ainda que ela não tenha tido consciência disso, a situação já estava equilibrada emocionalmente.

Sentando no Próprio Rabo

O problema é que a gente somente enxerga o rabo alheio, a injustiça que a gente comete, como o mau humor da minha cliente, a gente não se preocupa em enxergar até o momento que isso causa sofrimento.

Mas não faça assim, procure enxergar o próprio rabo antes que a dor de estar sentado em cima dele lhe cause sofrimento. Quanto mais justo você for com os outros, quanto mais equilibrar aquilo que desequilibrou, mais a natureza da sua vida equilibrará as coisas a seu favor.





2 comentários.

Fabio Gomes disse...

Valeu Dudu.
Minha vingança causou muita destruição, destilei o meu veneno para tudo e todos. Joguei pedras mesmo. Ofendi. Machuquei.

Agora chamarei a Justiça para equilibrar a coisa.

Droga.

Canto do Dudu - Dudu Lopes disse...

Oi, Fábio!

Tenho certeza que o equilíbrio vai vir e vai trazer coisas boas para todos.

Um abração,
Dudu.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...