domingo, 5 de abril de 2015

A Vida no Relativo e no Absoluto

Texto de SWAMI TILAK.

A atividade é a vida, mas a tranquilidade é a finalidade da vida.
Swami Tilak.

RESPEITÁVEIS MÃES e irmãos, boa noite. Este é o segundo dia em que estamos aqui com vocês. [*]

[*] Esta foi a segunda conferência proferida por Swami Tilak no auditório do Ministério das Minas e Energia, em Brasília, no dia 20 de outubro de 1973.

Quando eu encontrei meu mestre, meu guru, ele me perguntou:

– Qual a finalidade de tua vida?

Eu respondi:

– Gurudeva, eu quero servir a toda a humanidade.

Primeiro, Eu

Naquele momento ele riu e disse:

– Quem pode servir a toda a humanidade? – e depois contou uma história. - Havia um discípulo e um dia seu mestre lhe perguntou:

“– O que você quer fazer?

“– Eu quero cobrir toda a terra com peles, porque na terra existem muitos espinhos que machucam as pessoas ­respondeu o discípulo.

"“– Onde podes conseguir tantas peles? Como é possível? E também não podes conseguir peles sem matar as criaturas. E, depois, quando toda a terra estiver coberta com peles, não restará lugar algum para crescer nada. Então todas as pessoas irão morrer sem comida.”

Então eu perguntei:

– Gurudeva, que posso fazer?

E ele respondeu:

– Você tem que calçar sapatos, nada mais, e depois não ter nenhuma perturbação, nenhum medo dos espinhos.

Em suma, as palavras do meu mestre indicavam que a pessoa tem que obter sabedoria para eliminar todos os problemas que existem em sua vida. Aquele que não pode resolver seus problemas, não pode ajudar ninguém no mundo.

Conhecendo o Problema

Infelizmente, nós temos, às vezes, muita pressa e tratamos de ajudar a outras pessoas, sem saber a solução do problema. Tratamos de ajudar a outras pessoas sem conhecer o problema: qual é o problema?

Como tratei de explicar ontem, às vezes nós pensamos que a ausência do dinheiro é um problema. É uma face do problema! Outra pessoa sente que o sexo é um problema. Quando o sexo não está satisfeito, tem-se perturbação, agitação, e então o sexo deve ser satisfeito. Outra pessoa diz:

– Eu preciso de comida.

Uma outra necessita de casa e outras mais necessitam de outras coisas. Então nós tratamos de resolver os problemas segundo nossa compreensão da vida.

Mas depois de resolver um problema, imediatamente encontramos outro problema, e outro, que se sucedem. É como uma enfermidade.

Por exemplo, temos um veneno no corpo e esse veneno aparece na forma de uma enfermidade. E quando essa enfermidade se cura, outra enfermidade surge. Assim, temos todo o tempo enfermidades. Agora vocês podem compreender; me parece que nós não tratamos de eliminar a raiz da enfermidade, simplesmente tratamos de curá-la externamente. Por exemplo, quando uma pessoa tem dor de cabeça, outra logo se prontifica a recomendar que se tome aspirina, e quando tomamos aspirina, no outro dia temos problema com o estômago. Então quem recomendou aspirina diz:

– Agora você tem que tomar outro tipo de comprimido.

E assim toma-se remédio após remédio até tornar-se um paciente permanente, e o problema não se resolve.

Agora nós temos que resolver o problema permanentemente. E a solução permanente não é possível sem o conhecimento de nossa natureza, da natureza própria. Então surgem de imediato as perguntas seguintes:

  • Quem sou eu?
  • Qual é a minha natureza?
  • Por que estou aqui?

A Morte

Todas as coisas estão relacionadas com os nossos problemas. Como eu digo sempre, fisicamente ninguém pode estar no mundo o tempo todo. Como meu mestre sempre diz, o estômago da morte é muito grande! Tão grande que nem um Buddha, nem um Cristo, nem um Krishna, nem um Swami podem encher seu estômago. Não é possível. Sempre existe lugar no estômago da morte, que come todo o tempo. Nossa fome pode satisfazer-se, mas a fome da morte não pode satisfazer-se.

E há outra verdade também: é que nenhuma pessoa morre duas vezes. É verdade. Então não existe nenhuma razão para preocupar-se. Não existe.

– Eu tenho medo da morte – ­diz a maioria das pessoas.

Por que? Todos morrem! Aquele que trata de viver com todas as facilidades, com toda a segurança, também tem que morrer. Então nós devemos eliminar o medo da morte. O medo da morte é diferente da morte. Tratem de compreender isso, por favor. Quando eu falo sobre essas coisas, as pessoas dizem:

- Swami, nós temos que viver no mundo. Então, podemos cometer suicídio?

A Verdade

Não é certo, amigo meu! Uma pessoa que não tem medo da morte não tem que cometer suicídio; tem que realizar a Verdade!

E, sem dúvida, essa Verdade é uma coisa extraordinária, muito grande mesmo. A Verdade está relacionada com todo o universo!

Por exemplo, algo está relacionado comigo, e não existe em você. É uma verdade parcial, é uma verdade limitada, então não pode tornar-se verdade universal, não pode fazer-se a verdade onipresente. Então o que existe como a verdade onipresente tem que estar presente em vocês e em mim também. Em todos. Não é um privilégio meu ou de qualquer pessoa.

Neste campo nós não temos que pensar em milagres, ou que uma pessoa tem esse privilégio e outra não tem. Ou que uma tem mais poder e outra não tem. Não é isso. No campo da Verdade Suprema, sem dúvida, nós temos todos - todos nós - a mesma verdade. Então, agora nós temos que pensar na totalidade do universo, temos que buscar a verdade que está presente em todo o mundo.

O Mundo

Sem dúvida, nenhuma pessoa pode dizer que o mundo não existe; ninguém pode dizê-lo. Não podemos dizer que o mundo não é maravilhoso; não podemos dizê-lo. É uma coisa maravilhosa! Tanta atração! Tanta beleza no mundo!

E cada coisa tem sua beleza! Cada pessoa tem inteligência, cada pessoa tem suas particularidades e cada pessoa tem a expressão da Verdade também. Como a Bíblia diz, o homem é a imagem de Deus. Então a imagem de Deus nos lembra o próprio Deus. Portanto, depois de ver uma pessoa não podemos dizer que essa pessoa é insignificante. Não podemos. Assim, temos apenas que buscar a fonte da divindade, nada mais. Temos que entrar no universo para buscar a Verdade.

A Bíblia Não tem Dono

Geralmente eu menciono muitas coisas da Bíblia porque dessa maneira vocês poderão compreender a Verdade mais facilmente, segundo a terminologia que vocês conhecem. Por exemplo, se eu falasse na terminologia que está nos Vedas, nos Upanishads, ou em outras escrituras vocês poderiam não compreender. Então frequentemente eu falo sobre a Bíblia. Sem dúvida, às vezes as pessoas estranham:

– Swami, por que fala sobre a Bíblia?

Por exemplo, na Austrália uma mãe depois de escutar a conferência perguntou:

- Por que fala na Bíblia?

- Porque a Verdade existe na Bíblia, então eu falo.

- Mas você não é um cristão, você é um hinduísta; então, por que? Quer converter-se ao Cristianismo?

- Não, não é verdade, eu não quero me converter.

- Então, por que?

Cristo Não tem Dono

- A Bíblia não é sua propriedade; Cristo não é sua propriedade.

Cristo é universal. A verdade que existe na Bíblia é universal. Então, qualquer pessoa pode falar sobre a Bíblia. A verdade não pertence a uma pessoa ou a outra pessoa. A Verdade é a Verdade, como a luz do sol pode ser recebida por qualquer pessoa, assim a Verdade pode ser obtida por qualquer pessoa. Nesse campo não devemos manter limitações. Quando as pessoas mantêm limitações, não compreendem a Verdade.

Adão e Eva

Por exemplo, nós encontramos uma descrição muito boa na Bíblia: diz que, no princípio, era Deus. Depois, Deus criou Adão e depois Eva. Sem dúvida Eva foi criada de uma parte de Adão. E eles estavam no paraíso. E no paraíso existiam duas árvores: a árvore da vida e a outra era a árvore do mal e do bem. Dessas duas árvores, segundo Deus, o homem tinha que comer somente os frutos da árvore da vida; não tinha que comer os frutos da árvore do bem e do mal. Depois diz-se que uma serpente que estava no paraíso tratou de criar tentação na mente de Eva, e Eva comeu da árvore do bem é do mal, e depois criou a mesma tentação na mente do homem.

É uma descrição. Essa descrição é muito boa. Para aquele que crê na história, essa descrição é histórica, e para aquele que crê na espiritualidade, essa descrição é espiritual. Contém uma grande verdade. E temos que compreender essa verdade.

Matéria e Espírito

Amigo meu, todo o universo é paraíso, todo o universo. Neste paraíso do universo existem duas coisas: a Matéria e o Espírito. Todo o universo é uma combinação de matéria e espírito. É verdade. E em cada partícula está presente a matéria e a energia. Ambas estão presentes. E, sem dúvida, a matéria também é uma expressão da energia, nada mais.

Por exemplo, agora nós vemos esta mesa (Swami indica uma mesa próxima), e dizemos que esta mesa existe. Mas quando tratamos de compreender a verdade, imediatamente a mesa se converte em energia. Como Einstein diz: "A matéria não é nada mais que a energia densa." Então o que nos parece matéria, também é energia.

Alma e Energia

A matéria sai da energia, a matéria sai da Alma; a Alma não sai da matéria, é uma verdade. Então a matéria e a Alma, ambas estão juntas. Então a matéria é Eva e a Alma é Adão. E ambos existem no paraíso do universo. E nesse paraíso do universo, nós temos duas árvores: uma árvore da vida e uma árvore da consciência. Todo o tempo. A árvore da consciência ou, podemos dizer, a mente, produz dois sentidos: o sentido do mal e o do bem. Esses sentidos também persistem todo o tempo. Como uma árvore cresce todo o tempo, assim também cresce a árvore da mente. E, por outro lado, temos também a árvore da vida.

Todas as pessoas têm direito de tomar o fruto da vida. Aquele que não diferencia entre o mal e o bem também vive no mundo. Todas as pessoas vivem. Você vive e eu também vivo no mesmo mundo. Cristo viveu no mundo e Buddha também viveu no mundo. Todos vivem neste mundo, mas somente para Cristo não existe nenhum mal. Sem dúvida Ele quer seguir o caminho do bem, mas também não odeia o mal.

A Culpa é de Quem?

Vocês sabem que quando estava na frente de Cristo uma mulher que não tinha um caráter bom, Cristo disse aos que queriam apedrejá-la:

– Podem apedrejar, mas somente a pessoa que está isenta, que não tem nenhum pecado na vida, deve apedrejar.

Naquele momento não houve nenhuma pessoa que não tivesse pecado na sua vida. Então, o Santo, e somente o Santo, sabe que todas as pessoas têm pecado, todas as pessoas têm culpas na vida. Mas o ego não lhes deixa aceitar suas faltas. Simplesmente culpam as outras pessoas, é certo. O Santo diz:

– Eu sou culpável.

Mas uma pessoa ordinária ou uma pessoa comum diz:

– Eu sou um santo e os outros são pecadores.

Por que nós tratamos de esconder nossas próprias culpas? Por que sempre tratamos de culpar outras pessoas? Eu digo neste momento que a vida do Santo é muito diferente. Ele sempre diz que neste mundo não existe nenhuma pessoa mais culpável que ele e que os outros são muito bons.

Como Discriminar

Então, amigo meu, esta atitude é a atitude do Santo. Vive no mundo mas não reconhece o mal! Somente vê o bem.

Todo o tempo vê o bem, nada mais. Esta pessoa não tem nenhum problema com o mundo! Mas aquele que não tem esta atitude tem problema todo o tempo. Deus diz que uma pessoa tem que viver, nenhuma pessoa tem que morrer. Mas não deve diferenciar as coisas.

A Consciência Divina é contra a diferenciação. É contra as diferenças! É verdade!

Então agora eu digo, que esta combinação de matéria e espírito em nós cria o sentido do ego: "eu sou", "eu sou".

Na verdade eu sou parte da Divindade. Eu sou um com a Verdade Suprema!

Mas sempre trato de criar uma limitação ao redor da minha existência. Desta maneira eu me separo dos demais. Uma gota é simples água, e o mar também é água. Mas a limitação da água cria um sentido de separação, nada mais, nada mais!

O Ego

Ego é uma roupagem. Por favor, tratem de compreender.

Nós temos muitas roupas. Estas roupas são para cobrir nosso corpo, para esconder nossa nudez das outras pessoas.

Mas nós temos outro tipo de veste. Esta veste é a veste do ego. Nós tecemos esta vestimenta ao redor de nossa personalidade. E tratamos de separar-nos de toda existência e clamamos: "eu sou". Então criamos uma diferença entre eu e os demais! E por sua vez este sentido cria muitos problemas no mundo! Na verdade todos os problemas são resultado desta diferença, desta separação: eu e os demais.

“Esse Mundo Não Presta!”

Todos vivem no mundo, todos vivem no universo, mas todos dizem: "o mundo é mau" ou "o mundo é bom", mas eu pergunto:

– Você também está no mundo, por que não diz que você é mau? Por que não diz? Você também é mundo, é certo. Você também está no mundo.

E, quando todas as pessoas dizem que o mundo é mau, quem é bom então? Quem é bom? Então todos são maus.

Então, este sentido de que eu sou diferente do mundo, cria separação: eu e os demais. Sem dúvida esta diferença não é boa, temos que tirar esta diferença. Para tirar esta diferença, mais uma vez temos que buscar a verdade que existe em mim e nos demais também.

A Natureza do Mundo

Primeiro eu tenho que buscar a verdade no mundo. No mundo da matéria. E quando trato de compreender a natureza da matéria eu tenho uma grande confusão, eu tenho um grande problema!

Que é matéria? Eu tenho muitas definições sobre a matéria. Por exemplo, matéria é o que não se move. Mas a ciência diz agora que na matéria existem átomos e nos átomos existem elétrons, prótons e nêutrons. E os elétrons todo o tempo se movem. Então como podemos afirmar que matéria é o que não tem movimento? E nós tratamos de dar definição, tratamos de definir o átomo. Que é átomo? Que é elétron? E então temos problemas.

Às vezes o elétron se comporta como uma onda e outras vezes como partícula. E o que é partícula não pode tornar-se onda e o que é onda não pode fazer-se partícula, porque a partícula é estática e a onda é dinâmica! Ambas não podem juntar-se em nosso conceito. Mas é verdade. Então não podemos dizer que matéria é o que não se move. Não podemos determinar que seja estática ou dinâmica. É um grande complexo problema.

Vocês sabem que existem coisas que se comportam como pedra e que se comportam como uma planta também. E que existem plantas que se comportam como plantas e se comportam como animais também. Existem plantas que andam [*], capturam os animais, tomam o seu sangue e depois atiram o seu cadáver.

[*] NOTA DO REVISOR: não se conhece plantas que andam, ainda que existam plantas que se movem de um lugar para outro como o caiauê. Provavelmente, Swami Tilak quis dizer plantas que se movem, e trocou as palavras por não dominar completamente a língua portuguesa.

Então que tipo de definição pode dar-nos a matéria? É um problema!

A Natureza da Alma

E neste momento nossa mente diz que em lugar de buscar a definição de matéria, é melhor que busquemos compreender a definição da alma! Que é alma? E para termos a definição de alma, temos que entrar em nós mesmos.

Como eu disse ontem, cada pessoa tem a sua dor de cabeça, mas ninguém pode sentir a dor de cabeça fora de sua própria cabeça. Não é possível. Então está muito claro que nós temos que experimentar todas as coisas em nossa existência!

E quando nós tratamos de analisar nossa existência, a princípio nós encontramos nossos sentidos. Esses sentidos recebem o mundo exterior. Agora eu vejo vocês. Por que vejo? Porque meus olhos veem. Os olhos são o meio de receber as impressões de sua existência. Mas eu tenho outro tipo de sentido também.

Na realidade existem dois tipos de sentidos: os sentidos da cognição ou do conhecimento e os outros são os sentidos da ação. Então temos os da ação e os da cognição. Tato, olfato, visão, audição e paladar são os cinco sentidos de cognição. E temos também cinco sentidos da ação: pés, mãos, voz e os sentidos da procriação e da evacuação. Os sentidos da cognição recebem o mundo exterior e o relacionam com o mundo interior. Os sentidos da ação transmitem o mundo interior e o relacionam com o mundo exterior.

Por exemplo, quando vejo o fogo num lugar, imediatamente grito, depois corro, e logo apanho água. Então todos os sentidos neste momento trabalham simultaneamente. Isto indica que nós temos um centro de nossa personalidade, onde se juntam todos os sentidos. Este ponto em nossa personalidade é chamado de mente. E a mente também não é a finalidade, porque tratamos de diferenciar entre as coisas boas e más. Mas o intelecto também diferencia entre o mal e o bem. E por detrás do intelecto nós temos o ego. Esse ego é a particularidade de cada pessoa. Cada pessoa tem sua particularidade.

Por exemplo, todos estão presentes aqui e me veem. Mas cada pessoa tem sua impressão particular sobre minha personalidade. Todos não têm a mesma opinião a meu respeito. Uns dizem:

– Swami é muito bom.

Enquanto que outros dizem:

– Não, ele é muito mau.

Uma pessoa diz:

– Swami é muito inteligente.

E outros, ao mesmo tempo, falam:

– Não ele não sabe nada.

A Natureza do Ego

Uma pessoa me ama, outra me odeia. E não podemos dizer que essas opiniões se devem apenas a minha personalidade, minha aparência ou minha inteligência. Isso significa que cada pessoa tem o centro de sua personalidade, a que chamamos ego.

Esse ego se forma de três atributos, ou três gunas: Sattwa guna, Raja guna e Tama guna [*].

[*] Guna - atributo ou qualidade da Natureza. Sattwa se refere à serenidade, bondade e lucidez, impulsionadas pela boa vontade, compaixão e amor. Rajas indica atividade e energia, impulsionadas pelas ambições e pelas paixões; e Tamas indica a qualidade referente à inatividade e fraqueza, impulsionadas pela preguiça e perversões.

Sattwa guna significa a atividade positiva. A mente também é uma atividade. O pensamento é atividade. O pensamento tem começo, continuidade e finalmente se dissolve. A razão disto é que cada pensamento tem três etapas. Antes de começar, um pensamento é tranquilo, na continuidade, é ativo e, quando se dissolve, é inativo.

Então temos tranquilidade, atividade e inatividade, todas presentes em cada personalidade. Umas pessoas têm mais tranquilidade, outras têm mais atividade e outras têm mais inatividade.

Sem dúvida, inatividade não é tranquilidade. Quando se tenta compreender a filosofia oriental se diz que ela torna a pessoa inativa. Eu a isto digo, categoricamente, que não é certo. Talvez o que não se tenha é capacidade para diferenciar a tranquilidade da inatividade. Então se confunde uma com a outra. Uma pessoa que é tranquila nunca é inativa. E uma pessoa que é ativa não tem porque ser intranquila.

A Natureza da Tranquilidade

A intranquilidade está relacionada com a atitude mental. A atividade está relacionada com o corpo. Então nós temos que compreender esta verdade. Quando uma pessoa está ativa, muito bem: pode manter sua atividade e sua tranquilidade também. Por que não?

Vocês sabem que Cristo era muito ativo, Buddha era muito ativo, Krishna era muito ativo. Todo o Bhagavad Gita foi ensinado pelo Senhor Krishna num campo de batalha, não em casa. Então nós estamos no campo de batalha. Ninguém pode fazer-se totalmente inativo. O coração bate, o sangue corre, a mente pensa. Então, a inatividade não pode ser alcançada no mundo. E aquele que confunde a paz com a inatividade, tem desilusão, nada mais. Então, na atividade, tranquilidade; e na tranquilidade, atividade; é o que nós necessitamos na vida. Então Cristo era ativo, mas tranquilo também. Krishna era, ao mesmo tempo, tranquilo e ativo e, da mesma forma, nós também podemos ser assim.

Temos que fazer-nos tranquilos e ativos simultaneamente. Porque o mundo é para agir e nós temos que agir todo o tempo, mas temos que manter a tranquilidade.

O Senhor Krishna diz no Bhagavad Gita: "Até as pessoas inteligentes se confundem sobre a tranquilidade e a atividade". Fazem confusão de fato.

Aquele que vê atividade na inatividade e inatividade na atividade, é tranquilo todo o tempo. Aquele que é ativo na inatividade e inativo na atividade, é uma pessoa sábia. Como é possível isso? Temos que tentar buscar a tranquilidade cada vez mais e mais!

A Natureza da Vontade

O ego é o centro da personalidade, é o átomo da personalidade.

Vocês sabem que no átomo, em cada átomo, existem três partículas: os elétrons, que são positivos, os prótons, positivos e os nêutrons que são neutros. São três, em proporções diferentes. Num átomo temos um número de elétrons e, em outro, outra quantidade, mas a natureza do elétron não muda, nem a do próton tampouco muda. Simplesmente o número muda, a proporção muda.

Esta proporção, este número, é responsável pela formação, digamos assim, da personalidade de um outro elemento. Mas, detrás da forma deste átomo, existe a Mente Universal. E detrás da Mente Universal, existe a Natureza, e, sem dúvida, esta Natureza é o equilíbrio de todos os atributos.

Vocês sabem que quando nós chegamos a este ponto surge um grande problema, grande problema! Porque o estado de equilíbrio nunca pode mover-se. Então quem move este equilíbrio? A Natureza é o equilíbrio de todos os atributos, mas quem move a Natureza? Então necessitamos da Vontade.

Qualquer tipo de movimento necessita força de fora. A vontade não necessita de força de fora: a vontade pode mover ou não mover. Por exemplo, agora meu dedo não se move [Swami simula com uma mão]. Mas quando eu quero, imediatamente ele se move. Então, eu tenho o poder da vontade de mover ou não mover. Assim toda a natureza se move porque existe a vontade.

A vontade tem inteligência também, porque não podemos aceitar nenhuma vontade sem inteligência. A vontade que não é inteligente não é vontade, é simplesmente poder mecânico, nada mais. Então, aceitamos a vontade­-inteligência.

A Natureza da Felicidade

E aceitamos que essa Inteligência é eterna.

Essa Inteligência é a fonte da sabedoria, da felicidade. Isso, amigos meus, é sua própria natureza. A natureza própria de todos vocês. Vocês são inteligentes e têm felicidade. E têm verdade. Vocês são a Verdade! Vocês são inteligentes! Vocês são a Felicidade! Em sânscrito, este estado se chama Satchitananda. Sat - Verdade; Chit - Inteligência; e Ananda - Felicidade. E os três estão presentes em vocês.

Este Satchitananda é, em si, os três aspectos do mesmo Ser, que se manifesta nos vários aspectos da vida. Esta Inteligência aparece ou se manifesta pelo ego, intelecto, mente e sentidos. Esta Felicidade aparece ou se manifesta como os prazeres sensuais, como a felicidade momentânea.

E esta Verdade eterna aparece ou se manifesta como vida também. Vida é a manifestação limitada da Verdade Suprema. E os prazeres também são a manifestação da felicidade, da Ananda eterna. E a consciência que, no presente momento, nós temos das coisas é apenas uma manifestação da Inteligência Suprema.

Então, quando nós tratamos de compreender nossa existência, todas as coisas se juntam, e nós realizamos nossa existência como Satchitananda –  Inteligência, Verdade e Felicidade – todos estão em nossa existência.

E, sem dúvida, no mundo da vida limitada, não podemos tomar, não podemos gozar nunca todas essas potências simultaneamente. Não é possível.

Por exemplo, quando nós ligamos a lâmpada temos simplesmente um aspecto da eletricidade, que é a luz. E quando ligamos o ventilador, imediatamente temos outro aspecto da eletricidade que é o movimento, o magnetismo; e, quando ligamos uma outra coisa como o aquecedor, imediatamente percebemos mais um aspecto da eletricidade, que é o calor. Vemos com clareza, então, que pelos aparelhos e instrumentos, nunca podemos ter, ao mesmo tempo, todos os aspectos da eletricidade. Não é possível. Simplesmente temos um aspecto ou outro.

A Natureza da Limitação

Assim também, quando o nosso ser está relacionado com um dos sentidos, ou com a mente, ou com o intelecto, ou com o ego, simplesmente nós percebemos um aspecto do Ser. Então, nós sempre temos a inteligência, a felicidade e a verdade limitadas em nossa vida. E, assim, o ser humano não pode ter a experiência ou a realização da Vida Eterna, da Felicidade interminável e da Inteligência ilimitada. Para realizar a eletricidade verdadeira, nós temos que transcender todos os aparelhos.

Da mesma maneira, para realizar o Ser mesmo, temos que transcender nossos sentidos, nossa mente, nosso intelecto, toda a natureza. Toda a natureza, e nada mais. E, nesse campo, a mente é um obstáculo muito grande. Temos que vencer este obstáculo, sem dúvida! E, para vence-lo, necessitamos do Yoga. Yoga não é simplesmente uma ginástica, não é simplesmente algumas posturas.

Às vezes as pessoas perguntam:

– Swami, como eu posso aumentar meu poder físico?

Eu digo:

– Amigo meu, você deve consultar um médico ou alguém mais. Um médico pode dar melhor conselho nesse campo. Também você deve se alimentar bem, deve tomar leite, manteiga e todas as coisas que alimentam.

Para isto, Swami não é necessário. Swami é necessário para transcender tudo.

O Super-Homem

Tudo tem que ser transcendido. Quando nós transcendemos tudo, realizamos a Verdade Suprema! E, então, quando outra vez descemos [*], temos um outro mundo.

[*] À chamada consciência relativa.

Primeiro, Cristo tem que crucificar-se. E depois de crucificar-se, tem que alcançar a ressurreição, sem dúvida. E depois da ressurreição, Cristo também tem corpo, porém não este corpo e sim outro corpo. Então, em outro corpo, o homem vive. Assim, aquele que transcende todos os sentidos, toda a mente, todo o intelecto, todo o ego, toda a natureza, também tem que voltar para viver no mundo. Mas nesse momento não é a mesma pessoa.

Por exemplo, uma pessoa entra na universidade e depois de estudar muitos anos, regressa a sua casa outra vez. Neste momento não tem quatro braços ou oito pés. Neste momento tem dois pés e duas mãos. Mas a pessoa interior é diferente.

Assim, uma pessoa comum diz que o sol nasce e o sol se põe. E quem regressa da universidade diz que o sol não nasce e nem se põe, simplesmente a terra se move, nada mais. Assim a pessoa que realiza seu Ser é pessoa e você também é pessoa e o outro também é pessoa. Uma pessoa realizada come como nós comemos. Em lugar de comida não come ferro e não bebe vapor em lugar de água.

- Swami, nós temos grandes iogues que se deitam nos pregos e comem fogo - me dizem, na América Central.

Muito bem, amigo! Apesar disso nós temos que saber que existe um fogo muito grande. Este fogo é o da sensualidade. Há muitos espinhos, espinhos da miséria mundana, que é muito grande. Aquele que se deita sobre os espinhos, às vezes, não tem a capacidade de confrontar a miséria da vida.

Você sabe que as pessoas que lutam como soldados, no front, também têm angústias. Têm coragem para estarem no front das balas, mas não têm coragem de confrontar a luxúria. Então as flechas da luxúria são mais fortes que as flechas de ferro.

Espiritualidade e Ocultismo

O caminho da espiritualidade não é demonstração, exibição de coisas. Eu posso caminhar no fogo, eu posso caminhar na água. Isto não é espiritualidade, simplesmente é outra coisa. Eu não critico, eu simplesmente digo que aquele que faz, deve fazer, não há problema! Mas não se deve confundir essas coisas com espiritualidade. A espiritualidade é o domínio sobre todas as debilidades e fraquezas que existem em nossa mente.

Com estas palavras eu dou muito obrigado aos que nos deram sua atenção e muito obrigado às autoridades que nos deram esta oportunidade de falar a vocês. Amanhã vou falar aqui outra vez. Diversas vezes eu falo sobre meditação e como me parece que muitas das pessoas aqui são novas, eu vou falar novamente sobre meditação.

Devemos buscar a solução dos problemas e, sem dúvida, a meditação profunda, com sabedoria, é a solução de todos os problemas.

Perguntas e Respostas

Com estas palavras eu agradeço mais uma vez, e caso tenham perguntas eu posso responder.

Pergunta: Qual é a diferença entre desejo e vontade?

Resposta: Desejo não é vontade. E nós não devemos usar nossa vontade para realizar os desejos, porque quando nós usamos nossa vontade para realizar desejos, nós temos fraquezas na vida. Por exemplo, nunca todos nossos desejos podem se cumprir, não é possível, nenhuma pessoa pode realizar todos os desejos. Então quando nós tratamos de usar nossa vontade para realizar os desejos, nossa vontade simplesmente se enfraquece. Então a vontade deve ser usada para realizar o Ser mesmo. Nesse campo não existe nenhuma possibilidade de fraqueza.

Pergunta: Swami, como é possível àquele que atingiu a Verdade, no plano do Absoluto, fazer-se entender aos seus semelhantes?

Resposta: Na verdade, nenhuma pessoa pode nos dar a Realização, mas nos pode indica-la. Cada pessoa tem que realizar por si mesma. Por exemplo, experimento e sinto que a manga é doce. Eu posso dizer cem vezes que a "manga é doce", "a manga é doce", mas você não pode sentir e ter esse gosto da manga até que a coma você mesmo.

Sem dúvida, as palavras podem inspirar a muitos. Por isso Buddha não diz: "Eu posso passar a realização". A doutrina de Buddha não diz que esta experiência da Realização pode-se passar aos outros, não diz. É Auto-realização, amigo meu. É auto-realização.

Pergunta: Mas se a Verdade é atingida pode ser indicada a outro?

Resposto: É certo. Então Cristo disse, Krishna disse, Buddha disse, e eu também digo neste momento: minhas palavras não têm grande importância, mas a repetição da Verdade confere importância às minhas palavras também.

Pergunta: Eu fiz esta pergunta para anteceder outra, de ordem mais prática. Qual a relação do tempo em nossa existência, segundo sua opinião?

Resposta: O tempo existe no mundo, e quando uma pessoa transcende todo o mundo, não é escravo do tempo. É dono do tempo. Por exemplo, quando você está com a consciência desperta, só então pensa no tempo, mas aquele que dorme não tem nenhum sentido do tempo. O tempo passa, é certo.

Nós devemos compreender que o tempo existe na mente! Com relação a nós o tempo que existe no mundo é o reflexo do tempo que existe na mente. Sem dúvida é a consciência do tempo que muda o tempo, segundo nossa consciência!

Por exemplo, esta conferência durou uma hora e meia. E, quando você sonha, ela pode durar cinco minutos ou menos ainda. E, no sonho, talvez você possa ver toda a conferência. Assim como uma conferência pode durar uma hora, e no sonho cinco minutos, então cinco minutos equivalem a uma hora ou a hora e meia.

Você sabe que vemos nos sonhos incidentes que ocorrem na época atual ou há vinte e cinco anos atrás. O conceito do tempo muda completamente segundo nossa consciência. E, quando ascendemos à mente mesma - à nossa própria mente - o tempo não existe. É eternidade. O que existe no tempo é relativo e o que existe fora do tempo é absoluto.

Fonte: Jnana Mandiram.





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