sábado, 11 de outubro de 2008

Sobre a Auto-Ajuda

Texto de Edison Rabello Jr.

A VIDA DE UM SER humano comum, como eu e você, deveria ser um esforço permanente para integrar três níveis nos quais precisamos atuar, a fim de que tenhamos uma existência equilibrada com o objetivo primordial de evoluir. São eles os níveis material, oculto e espiritual.

No primeiro nível, o material, buscamos atender nossas necessidades básicas de sobrevivência, tais como comer, vestir, dormir, nos relacionar com outras pessoas, ganhar dinheiro, etc. A maior parte de nós atua 100% neste nível.

No segundo nível, o oculto, no qual pouquíssimas pessoas atuam conscientemente, deveríamos agir no sentido de compreender o que está velado por trás de tudo o que fazemos no nível material, incluindo a lista do parágrafo anterior, e ainda de como funciona o complexo jogo das trocas de energia entre nós, humanos, e entre nós e tudo o que nos rodeia, inclusive outros seres - vivos ou não - e as circunstâncias de nossas vidas. Aqui também lidamos com emoções e pensamentos, tanto nossos como dos outros seres - humanos ou não.

Nesses dois primeiros níveis é onde criamos causas e sofremos os efeitos de nossos atos passados, sejam eles desta ou de outras vidas, no processo conhecido como karma. Karma, entendido assim, é a Lei das Causas e Efeitos, mas a palavra karma significa apenas "ação", o que mostra que é impossível estar vivo sem gerar karma, seja ele bom ou mau, porque não podemos viver sem agir em algum momento - pelo menos não nesses níveis de consciência.

O terceiro nível é o espiritual. Neste nível atuamos na busca por nossa união com o Divino e esta busca se dá a partir de nosso interior. Como auxílio para aprofundarmos essa busca, temos o exemplo das vidas dos grandes seres e santos que desde sempre abriram mão de suas vidas em prol da evolução espiritual da humanidade e de toda a Criação. Quando passamos a agir a partir da consciência deste nível, já obtivemos a capacidade de atuar segundo Leis bem definidas, sabendo suas reais implicações e efeitos e não nos permitimos mais cometer erros; seguimos a onda de Vida e vamos convictos em direção ao objetivo final.

Evolução em Paralelo

Entretanto, não devemos enxergar esses níveis como degraus de um processo e sim como áreas da vida que devem ser vividas paralelamente, integradas, pois o excesso num dos três sentidos vai fazer falta aos outros. Se os tomarmos como degraus de uma escada, poderíamos pensar, por exemplo, que antes de atuarmos na área oculta teríamos que ter uma evolução completa do corpo físico, e que para isso deveríamos todos chegar aos limites da perfeição física; teríamos todos que nos transformar em deuses e deusas gregos de beleza antes de entrar na área oculta da vida; e depois disso deveríamos todos nos tornar clarividentes antes que pudéssemos viver a área espiritual.

A coisa não funciona assim. A Natureza respeita a individualidade e os limites de cada um, mas principalmente o esforço pessoal no sentido da evolução. Por mais paradoxal que pareça - e queiramos nos conscientizar ou não - o objetivo de estarmos vivos é ser algo muito maior do que apenas ser gente - é nos tornarmos unificados em Deus, voltarmos à fonte de tudo.

E em cada nível nossos atos podem nos ajudar nessa jornada. É necessário adotarmos uma postura correta em tudo o que fazemos na vida e principalmente, colocar nossos esforços em entender como este "tripé" evolutivo funciona, trazendo para o nível "inferior" - o material - a consciência adquirida nos outros dois níveis. Assim podemos viver as situações mais prosaicas e atuar sobre elas com conhecimento de causas e efeitos; e ainda que não possamos evitar, eventualmente, a geração de um karma negativo, o conhecimento adquirido pode nos auxiliar pelo menos a dimensionar as conseqüências futuras desses atos e nos preparar para colocar as mãos na massa da forma correta quando chegar a hora de vivê-los e resolvê-los.

Evitando Confundir os Limites

Um erro comum que cometemos ao começarmos a integrar as três áreas é confundir o alcance de nossas ações. Cada coisa funciona em seu nível apropriado. Tomemos, como exemplo, a onipresença da auto-ajuda no modo de vida ocidental moderno. Esta filosofia se tornou um dos ramos mais populares e rentáveis do conhecimento humano nos últimos tempos. Milhões de publicações, cursos, websites, "mestres" e afins entopem nossos sentidos com as mais diversas "curas" e promessas de "auto-aperfeiçoamento" que se possa imaginar, geralmente em troca de um bom retorno financeiro. Não, não sou contra a auto-ajuda, até porque tudo o que disse até agora passa justamente pelo "auto-alguma-coisa", já que o processo de evolução é necessariamente individual e comumente chamado de auto-conhecimento.

É preciso colocar a euforia da auto-ajuda no lugar correto, no nível correto. A primeira coisa a se fazer é adotar a postura correta e enxergar a auto-ajuda como uma ferramenta como outra qualquer, que pode auxiliar no sentido de afastar um pouco a consciência habitual do dia-a-dia, aumentando o campo de visão e fazendo parar a mente - nem que seja por alguns minutos ou segundos. Se assim não for, torna-se um vício e as pessoas passam a tomar os meios pelos fins e então a coisa passa a ser um entrave e não um auxílio.

Depois, essa filosofia pode auxiliar a questionar a realidade à qual estamos acostumados. Quando lemos em alguma obra de auto-ajuda que é necessário termos mais qualidade de vida isso pode nos impulsionar, por exemplo, no sentido de buscarmos nos alimentar melhor, de forma mais natural, mesmo que não sigamos as dicas que lemos. Se não temos outra fonte de referência isso é melhor do que nada, desde que estejamos agindo com a consciência correta.

Preferir a Solução à Salvação

O grande dano que tal filosofia pode fazer à evolução pessoal é vender qualquer tipo de salvação, quando deveria servir meramente como ferramenta para auxiliar na solução de nossas imperfeições. Assim, um chamado "mestre espiritual" da auto-ajuda induz uma grande quantidade de pessoas a acreditar que elas obterão a iluminação espiritual seguindo o que é dito nos livros dele, sem levar em consideração as conseqüências ocultas (kármicas) e espirituais que sobrevirão de seus atos.

Iluminação não está ao alcance da absoluta maioria de nós, nem nessa nem em muitas outras vidas pela frente - a não ser pela Graça Divina - simplesmente porque não é um processo linear e nem mágico. Não basta ler um punhado de livros ou escrevê-los, nem fazer "zazen", ou ainda se retirar do mundo pra viver nas montanhas do Himalaia se a busca pela iluminação não parte de dentro, do que há de mais elevado em nós. Iluminados são aqueles seres que conseguiram apagar sua luz própria, que vem do ego, e passaram a refletir a Luz Divina, como espelhos. Sua tarefa se assemelha à do sol, que ilumina, dá calor e vitalidade sem esforço, sem pedir nada em troca, somente porque essa é sua natureza.

A Evolução é Gradual

Então é evidente o porquê de não estarmos em condições de nos tornar iluminados de uma hora para outra da forma como a filosofia da auto-ajuda apregoa. Mas também é evidente que de forma alguma devemos sentar e esperar que a iluminação venha por si só. O que chamamos de vida espiritual é um constante ir ao encontro do Divino, mas cada passo de acordo com nossa capacidade e nossos recursos disponíveis. E então a Natureza vai, paulatinamente, nos provendo com mais recursos e assim temos condições de avançar mais e mais no Caminho.

Assim como temos nossos altos e baixos na vida comum, também temos altos e baixos na vida espiritual. Em determinados momentos estamos bem, em outros estamos mal. Mesmo caminhando firmes em frente, haverá ocasiões nas quais cairemos, ou tropeçaremos nos obstáculos que vão aparecendo pelo caminho e então teremos que recuar. Seja porque fizemos algumas más escolhas (mau karma) que agora reclamam solução, seja porque alcançamos determinado nível além do qual nossos recursos são insuficientes e precisamos parar e ver como consegui-los, ou porque o momento certo ainda não chegou.

A Responsabilidade é Nossa

Nesse momento entram em ação Forças Ocultas que gerenciam nossas vidas e criam circunstâncias que nos façam parar e esperar. O que determina o maior ou menor avanço é o grau de conhecimento, de consciência adquirida dos processos em andamento e o grau de nosso relacionamento interno com estas Forças Ocultas, pois todos os recursos que estão ou estarão à nossa disposição para a solução de nossos problemas têm origem nestas Forças e elas nos "darão" não o que pedimos, mas o que é necessário à nossa evolução.

Quando conseguimos juntar estes dois fatores - conhecimento e interação com as Forças - com a coragem, a entrega e a determinação interior necessárias ao crescimento interior, aprendemos a ver as circunstâncias favoráveis e desfavoráveis como ferramentas e oportunidades de aprendizado e não como algum tipo de bônus ou punição. Quando entramos no estado correto, na postura correta, tudo passa a ter significado, todas as coisas passam a ter uma finalidade específica em nossa trajetória.

E então percebemos que nossa evolução pessoal e espiritual é responsabilidade apenas nossa, que por nossos atos e pensamentos atraímos ou rejeitamos tudo aquilo que nos acontece.





4 comentários.

José Cambeiro disse...

Caro Junior, bom dia!
Li seu texto e o achei muito bom, mas discordo dos seus três nivéis, pois acredito que o ocolto e o espiritual sejam um só.
Em primeiro porque somos todos interligados de alguma forma e dependendo da filosofia que você adota seremos todos irmãos em crescimento, a verdade é que somos todos interligados que que qualquer ação que eu faça boa ou má vai voltar para mim, todas as coisas são interligadas, natureza, seres vivos, etc..
Deveriamos como disse um grande sabio " Amar ao próximo como Ama a ti mesmo", mas nós nos destruímos com bebidas, cigarros, brigamos, etc..
Quando chegarmos ao ponto de só fazermos o bem sem ver a quem e sem interesse e receber nada em troca aí sim estaremos dando um grande passo para um futuro próximo nos consideramos mesmo irmãos.

um grande abraço

Edison Rabello disse...

Querido Cambeiro

Valeu pelo comentário e pela troca de idéias. A idéia aqui do Canto é essa mesmo, passar um pouco do que a gente vai aprendendo pela vida e ouvindo o que os outros também têm a dizer - concordando ou não. Assim acho que estaremos todos no rumo de um mundo melhor pra todos.

Gostaria que você lesse os demais textos do blog, e este em especial, do meu amigo Dudu:

http://cantododudu.blogspot.com/2007/09/espiritualidade-ocultismo-e-religio.html

Um grande abraço.

Junior

Anônimo disse...

Estava lendo os seus textos. Você escreve muito bem e aborda os assunto de maneira interessante. Muito bom o blog.

Ariella Rayder

Canto do Dudu - Dudu Lopes disse...

Obrigado, Ariella, eu agradeço por mim e pelo Júnior, meu colaborador eventual e autor deste texto e outros aqui pelo Canto do Dudu.

Um abração,
Dudu.

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